Biofilosofia da Percepção
Sensação e percepção O conhecimento sensível também é chamado de conhecimento empírico ou experiência sensível e suas formas principais são a sensação e a percepção. A tradição filosófica, até o século XX, distinguia sensação de percepção pelo grau de complexidade. A sensação é o que nos dá as qualidades exteriores e interiores, isto é, as qualidades dos objetos e os efeitos internos dessas qualidades sobre nós. Na sensação vemos, tocamos, sentimos, ouvimos qualidades puras e diretas: cores, odores, sabores, texturas. Sentimos o quente e o frio, o doce e o amargo, o liso e o rugoso, o vermelho e o verde, etc. Sentir é algo ambíguo, pois o sensível é, ao mesmo tempo, a qualidade que está no objeto e o sentimento interno que nosso corpo possui das qualidades sentidas. Por isso, a tradição costuma dizer que a sensação é uma reação corporal imediata a um estímulo ou excitação externa, sem que seja possível distinguir, no ato da sensação, o estímulo exterior e o sentimento interior. Essa distinção só poderia ser feita num laboratório, com análise de nossa anatomia, fisiologia e sistema nervoso. Quando examinamos a sensação, notamos que ninguém diz que sente o quente, vê o azul e engole o amargo. Pelo contrário, dizemos que a água está quente, que o céu é azul e que o alimento está amargo. Isto é, sentimos as qualidades como integrantes de seres mais amplos e complexos do que a sensação isolada de cada qualidade. Por isso, se diz que, na realidade, só temos sensações sob a forma de percepções, isto é, de sínteses de sensações. Ingres Empirismo e intelectualismo Duas grandes concepções sobre a sensação e a percepção fazem parte da tradição filosófica: a empirista e a intelectualista. Para os empiristas, a sensação e a percepção dependem das coisas exteriores, isto é, são causadas por estímulos externos que agem sobre nossos sentidos e sobre o nosso sistema nervoso, recebendo uma resposta que parte de nosso cérebro, volta a percorrer nosso sistema nervoso e chega aos nossos sentidos sob a forma de uma sensação (uma cor, um sabor, um odor), ou de uma associação de sensações numa percepção (vejo um objeto vermelho, sinto o sabor de uma carne, sinto o cheiro da rosa, etc.). A sensação seria pontual, isto é, um ponto do objeto externo toca um de meus órgãos dos sentidos e faz um percurso no interior do meu corpo, indo ao cérebro e voltando às extremidades sensoriais. Cada sensação é independente das outras e cabe à percepção unificá-las e organizá-las numa síntese. A causa do conhecimento sensível é a coisa externa, de modo que a sensação e a percepção são efeitos passivos de uma atividade dos corpos exteriores sobre o nosso corpo. O conhecimento é obtido por soma e associação das sensações na percepção e tal soma e associação dependem da freqüência, da repetição e da sucessão dos estímulos externos e de nossos hábitos. Para os intelectualistas, a sensação e a percepção dependem do sujeito do conhecimento e a coisa exterior é apenas a ocasião para que tenhamos a sensação ou a percepção. Nesse caso, o sujeito é ativo e a coisa externa é passiva, ou seja, sentir e perceber são fenômenos que dependem da capacidade do sujeito para decompor um objeto em suas qualidades simples (a sensação) e de recompor o objeto como um todo, dando-lhe organização e interpretação (a percepção). A passagem da sensação para a percepção é, neste caso, um ato realizado pelo intelecto do sujeito do conhecimento, que confere organização e sentido às sensações. Não haveria algo propriamente chamado percepção, mas sensações dispersas ou elementares; sua organização ou síntese seria feita pela inteligência e receberia o nome de percepção. Assim, na sensação, “sentimos” qualidades pontuais, dispersas, elementares e, na percepção, “sabemos” que estamos tendo sensação de um objeto que possui as qualidades sentidas por nós. Como disse um filósofo, perceber é “saber que percebo”; ver é “pensamento de ver”; ouvir é “pensamento de ouvir”, e assim por diante. Para os empiristas, a sensação conduz à percepção como uma síntese passiva, isto é, que depende do objeto exterior. Para os intelectualistas, a sensação conduz à percepção como síntese ativa, isto é, que depende da atividade do entendimento. Para os empiristas, as idéias são provenientes das percepções. Para os intelectualistas, a sensação e a percepção são sempre confusas e devem ser abandonadas quando o pensamento formula as idéias puras. Psicologia da forma e fenomenologia Em nosso século, porém, a Filosofia alterou bastante essas duas tradições e as superou numa nova concepção do conhecimento sensível. As mudanças foram trazidas pelo fenomenologia de Husserl e pela Psicologia da Forma ou teoria da Gestalt (Gestalt é uma palavra alemã que significa: configuração, figura estruturada, forma). Ambas mostraram: ? contra o empirismo, que a sensação não é reflexo pontual ou uma resposta físico-fisiológica a um estímulo externo também pontual; ? contra o intelectualismo, que a percepção não é uma atividade sintética feita pelo pensamento sobre as sensações; ? contra o empirismo e o intelectualismo, que não há diferença entre sensação e percepção. Caravaggio Empiristas e intelectualistas, apesar de suas diferenças, concordavam num aspecto: julgavam que a sensação era uma relação de causa e efeito entre pontos das coisas e pontos de nosso corpo. As coisas seriam como mosaicos de qualidades isoladas justapostas e nosso aparelho sensorial (órgãos dos sentidos, sistema nervoso e cérebro) também seria um mosaico de receptores isolados e justapostos. Por isso, a percepção era considerada a atividade que “somava” ou “juntava” as partes numa síntese que seria o objeto percebido. Fenomenologia e Gestalt, porém, mostram que não há diferença entre sensação e percepção porque nunca temos sensações parciais, pontuais ou elementares, isto é, sensações separadas de cada qualidade, que depois o espírito juntaria e organizaria como percepção de um único objeto. Sentimos e percebemos formas, isto é, totalidades estruturadas dotadas de sentido ou de significação. Assim, por exemplo, ter a sensação e a percepção de um cavalo é sentir/perceber de uma só vez sua cor (ou cores), suas partes, sua cara, seu lombo e seu rabo, seu porte, seu tamanho, seu cheiro, seus ruídos, seus movimentos. O cavalopercebido não é um feixe de qualidades isoladas que enviam estímulos aos meus órgãos dos sentidos (como suporia o empirista), nem um objeto indeterminado esperando que meu pensamento diga às minhas sensações: “Este objeto é um cavalo” (como suporia o intelectualista). O cavalo-percebido não é um mosaico de estímulos exteriores (empirismo), nem uma idéia (intelectualismo), mas é, exatamente, um cavalo-percebido. As experiências conhecidas como figura-e-fundo mostram que não temos sensações parciais, mas percepções globais de uma forma ou de uma estrutura. As experiências com formas “incompletas” mostram que a percepção sempre percebe uma totalidade completa, o que seria impossível se tivéssemos sensações elementares que o pensamento unificaria numa percepção. Se a percepção fosse uma soma de sensações parciais e se cada sensação dependesse dos estímulos diretos que as coisas produzissem em nossos órgãos dos sentidos, então teríamos que ver como sendo de mesmo tamanho duas linhas que são objetivamente de mesmo tamanho. Mas a experiência mostra que nós as percebemos como formas ou totalidades diferentes. Escrito por Leandro Rhein
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A percepção (Vamos entender a Biofilosofia da Percepção Visual)
O que é a percepção? A percepção possui as seguintes características: ? é o conhecimento sensorial de configurações ou de totalidades organizadas e dotadas de sentido e não uma soma de sensações elementares; sensação e percepção são a mesma coisa; ? é o conhecimento de um sujeito corporal, isto é, uma vivência corporal, de modo que a situação de nosso corpo e as condições de nosso corpo são tão importantes quanto a situação e as condições dos objetos percebidos; ? é sempre uma experiência dotada de significação, isto é, o percebido é dotado de sentido e tem sentido em nossa história de vida, fazendo parte de nosso mundo e de nossas vivências; ? o próprio mundo exterior não é uma coleção ou uma soma de coisas isoladas, mas está organizado em formas e estruturas complexas dotadas de sentido. Uma paisagem, por exemplo, não é uma soma de coisas que estão apenas próximas umas das outras, mas é a percepção de coisas que formam um todo complexo e com sentido: o vale só é vale por causa da montanha, cuja altura e distância só podem ser avaliadas porque há o céu, as árvores, um rio e um caminho; o verde do vale só pode ser percebido por contraste com o cinza ou o dourado da montanha; o azul do céu só pode ser percebido por causa do verde da vegetação e o marrom da terra; essa paisagem será um espetáculo de contemplação se o sujeito da percepção estiver repousado, mas será um objeto digno de ser visto por outros se o sujeito da percepção for um pintor, ou será um obstáculo, se o sujeito da percepção for um viajante que descobre que precisa ultrapassar a montanha. Em resumo: na percepção, o mundo possui forma e sentido e ambos são inseparáveis do sujeito da percepção; ? a percepção é assim uma relação do sujeito com o mundo exterior e não uma reação físico-fisiológica de um sujeito físico-fisiológico a um conjunto de estímulos externos (como suporia o empirista), nem uma idéia formulada pelo sujeito (como suporia o intelectualista). A relação dá sentido ao percebido e ao percebedor, e um não existe sem o outro; ? O mundo percebido é qualitativo, significativo, estruturado e estamos nele como sujeitos ativos, isto é, damos às coisas percebidas novos sentidos e novos valores, pois as coisas fazem parte de nossas vidas e interagimos com o mundo; ? o mundo percebido é um mundo intercorporal, isto é, as relações se estabelecem entre nosso corpo, os corpos dos outros sujeitos e os corpos das coisas, de modo que a percepção é uma forma de comunicação que estabelecemos com os outros e com as coisas; ? a percepção depende das coisas e de nosso corpo, depende do mundo e de nossos sentidos, depende do exterior e do interior, e por isso é mais adequado falar em campo perceptivo para indicar que se trata de uma relação complexa entre o corpo-sujeito e os corpos-objetos num campo de significações visuais, tácteis, olfativas, gustativas, sonoras, motrizes, espaciais, temporais e lingüísticas. A percepção é uma conduta vital, uma comunicação, uma interpretação e uma valoração do mundo, a partir da estrutura de relações entre nosso corpo e o mundo; ? a percepção envolve toda nossa personalidade, nossa história pessoal, nossa afetividade, nossos desejos e paixões, isto é, a percepção é uma maneira fundamental de os seres humanos estarem no mundo. Percebemos as coisas e os outros de modo positivo ou negativo, percebemos as coisas como instrumentos ou como valores, reagimos positiva ou negativamente a cores, odores, sabores, texturas, distâncias, tamanhos. O mundo é percebido qualitativamente, efetivamente e valorativamente. Quando percebemos uma outra pessoa, por exemplo, não temos uma coleção de sensações que nos dariam as partes isoladas de seu corpo, mas a percebemos como tendo uma fisionomia (agradável ou desagradável, bela ou feia, serena ou agitada, sadia ou doentia, sedutora ou repelente) e por essa percepção definimos nosso modo de relação com ela; ? a percepção envolve nossa vida social, isto é, os significados e os valores das coisas percebidas decorrem de nossa sociedade e do modo como nela as coisas e as pessoas recebem sentido, valor ou função. Assim, objetos que para nossa sociedade não causam temor, podem causar numa outra sociedade. Por exemplo, em nossa sociedade, um espelho ou uma fotografia são objetos funcionais ou artísticos, meios de nos vermos em imagem; no entanto, para muitas sociedades indígenas, ver a imagem de alguém ou a sua própria é ver a alma desse alguém e fazê-lo perder a identidade e a vida, de modo que a percepção de um espelho ou de uma fotografia pode ser uma percepção apavorante; ? a percepção nos oferece um acesso ao mundo dos objetos práticos e instrumentais, isto é, nos orienta para a ação cotidiana e para as ações técnicas mais simples; a percepção é uma forma de conhecimento e de ação fundamental para as artes, que são capazes de criar um “outro” mundo pela simples alteração que provoca em nossa percepção cotidiana e costumeira. Basta lembrar aqui o texto de Clarice Lispector sobre o inseto e sobre o ovo ; ? a percepção não é uma idéia confusa ou inferior, como julgava a tradição, mas uma maneira de ter idéias sensíveis ou significações perceptivas; ? a percepção está sujeita a uma forma especial de erro: a ilusão, como vimos no exemplo dos versos de Mário de Andrade sobre a garoa de São Paulo, a confusão do branco e do negro, do pobre e do rico.  Percepção e teoria do conhecimento Do ponto de vista das teorias do conhecimento, há três concepções principais sobre o papel da percepção: 1. nas teorias empiristas, a percepção é a única fonte de conhecimento, estando na origem das idéias abstratas formuladas pelo pensamento. Hume, por exemplo, afirma que todo conhecimento é percepção e que existem dois tipos de percepção: as impressões (sensações, emoções e paixões) e as idéias (imagens das impressões); 2. nas teorias racionalistas intelectualistas, a percepção é considerada não muito confiável para o conhecimento porque depende das condições particulares de quem percebe e está propensa a ilusões, pois freqüentemente a imagem percebida não corresponde à realidade do objeto. Vemos o Sol menor do que a Terra, mas ele realmente é maior do que ela. Descartes menciona o modo como percebemos um bastão mergulhado na água: embora o bastão seja reto e contínuo, percebemos a parte mergulhada como se o bastão estivesse entortado e como se houvesse descontinuidade entre a parte que está fora da água e a parte mergulhada. O bastão é percebido como distorcido, embora, na realidade, não esteja deformado. Para a concepção racionalista intelectualista, o pensamento filosófico e científico deve abandonar os dados da percepção e formular as idéias em relação com o percebido; trata-se de explicar e corrigir a percepção; 3. na teoria fenomenológica do conhecimento, a percepção é considerada originária e parte principal do conhecimento humano, mas com uma estrutura diferente do pensamento abstrato, que opera com idéias. Qual a diferença? A percepção sempre se realiza por perfis ou perspectivas, isto é, nunca podemos perceber de uma só vez um objeto, pois somente percebemos algumas de suas faces de cada vez; no pensamento, nosso intelecto compreende uma idéia de uma só vez e por inteiro, isto é, captamos a totalidade do sentido de uma idéia de uma só vez, sem precisar examinar cada uma de suas “faces”. Na percepção, nunca poderemos ver, de uma só vez, as seis faces de um cubo, pois “perceber um cubo” significa, justamente, nunca vê -lo de uma só vez por inteiro. Ao contrário, quando o geômetra pensa o cubo, ele o pensa como figura de seis lados e, para seu pensamento, as seis faces estão todas presentes simultaneamente. Quanto ao problema da ilusão, a fenomenologia considera que ela não existe. Se tomarmos, por exemplo, o verso de Mário de Andrade, diremos que perceber uma pessoa sob a garoa ou a neblina de São Paulo é percebê-la como negra de longe e branca de perto ou como branca de longe e negra de perto: são quatro percepções diferentes e que são como são porque perceber é sempre perceber um campo de objetos que permite corrigir uma percepção por meio de outra. Podemos compreender mais claramente a diferença entre as três concepções através de um exemplo, oferecido pelo filósofo Merleau-Ponty: Olhemos para uma piscina ladrilhada de verde-claro e rodeada por um jardim. O que percebemos? O empirista dirá que recebemos estímulos de todos os elementos que estão em nosso campo visual: cores, sons, reflexos; que esses estímulos isolados são levados a nosso cérebro, onde causam uma impressão e que a consciência dessa impressão é a percepção como soma dos estímulos. In: Convite à Filosofia de Marilena Chauí Escrito por Leandro Rhein às 18h26
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Curso de Filosofia para entender melhor Neurovisão-Marilena Chauí
Parte 01 Para que Filosofia? Ora, muitos fazem uma outra pergunta: afinal, para que Filosofia? É uma pergunta interessante. Não vemos nem ouvimos ninguém perguntar, por exemplo, para que matemática ou física? Para que geografia ou geologia? Para que história ou sociologia? Para que biologia ou psicologia? Para que astronomia ou química? Para que pintura, literatura, música ou dança? Mas todo mundo acha muito natural perguntar: Para que Filosofia? Em geral, essa pergunta costuma receber uma resposta irônica, conhecida dos estudantes de Filosofia: “A Filosofia é uma ciência com a qual e sem a qual o mundo permanece tal e qual”. Ou seja, a Filosofia não serve para nada. Por isso, se costuma chamar de “filósofo” alguém sempre distraído, com a cabeça no mundo da lua, pensando e dizendo coisas que ninguém entende e que são perfeitamente inúteis. Essa pergunta, “Para que Filosofia?”, tem a sua razão de ser. Em nossa cultura e em nossa sociedade, costumamos considerar que alguma coisa só tem o direito de existir se tiver alguma finalidade prática, muito visível e de utilidade imediata. Por isso, ninguém pergunta para que as ciências, pois todo mundo imagina ver a utilidade das ciências nos produtos da técnica, isto é, na aplicação científica à realidade. Todo mundo também imagina ver a utilidade das artes, tanto por causa da compra e venda das obras de arte, quanto porque nossa cultura vê os artistas como gênios que merecem ser valorizados para o elogio da humanidade. Ninguém, todavia, consegue ver para que serviria a Filosofia, donde dizer-se: não serve para coisa alguma. Parece, porém, que o senso comum não enxerga algo que os cientistas sabem muito bem. As ciências pretendem ser conhecimentos verdadeiros, obtidos graças a procedimentos rigorosos de pensamento; pretendem agir sobre a realidade, através de instrumentos e objetos técnicos; pretendem fazer progressos nos conhecimentos, corrigindo-os e aumentando-os. Ora, todas essas pretensões das ciências pressupõem que elas acreditam na existência da verdade, de procedimentos corretos para bem usar o pensamento, na tecnologia como aplicação prática de teorias, na racionalidade dos conhecimentos, porque podem ser corrigidos e aperfeiçoados. Verdade, pensamento, procedimentos especiais para conhecer fatos, relação entre teoria e prática, correção e acúmulo de saberes: tudo isso não é ciência, são questões filosóficas. O cientista parte delas como questões já respondidas, mas é a Filosofia quem as formula e busca respostas para elas. Assim, o trabalho das ciências pressupõe, como condição, o trabalho da Filosofia, mesmo que o cientista não seja filósofo. No entanto, como apenas os cientistas e filósofos sabem disso, o senso comum continua afirmando que a Filosofia não serve para nada. Para dar alguma utilidade à Filosofia, muitos consideram que, de fato, a Filosofia não serviria para nada, se “servir” fosse entendido como a possibilidade de fazer usos técnicos dos produtos filosóficos ou dar-lhes utilidade econômica, obtendo lucros com eles; consideram também que a Filosofia nada teria a ver com a ciência e a técnica. Para quem pensa dessa forma, o principal para a Filosofia não seriam os conhecimentos (que ficam por conta da ciência), nem as aplicações de teorias (que ficam por conta da tecnologia), mas o ensinamento moral ou ético. A Filosofia seria a arte do bem viver. Estudando as paixões e os vícios humanos, a liberdade e a vontade, analisando a capacidade de nossa razão para impor limites aos nossos desejos e paixões, ensinando-nos a viver de modo honesto e justo na companhia dos outros seres humanos, a Filosofia teria como finalidade ensinarnos a virtude, que é o princípio do bem-viver. Essa definição da Filosofia, porém, não nos ajuda muito. De fato, mesmo para ser uma arte moral ou ética, ou uma arte do bem-viver, a Filosofia continua fazendo suas perguntas desconcertantes e embaraçosas: O que é o homem? O que é a vontade? O que é a paixão? O que é a razão? O que é o vício? O que é a virtude? O que é a liberdade? Como nos tornamos livres, racionais e virtuosos? Por que a liberdade e a virtude são valores para os seres humanos? O que é um valor? Por que avaliamos os sentimentos e as ações humanas? Assim, mesmo se disséssemos que o objeto da Filosofia não é o conhecimento da realidade, nem o conhecimento da nossa capacidade para conhecer, mesmo se disséssemos que o objeto da Filosofia é apenas a vida moral ou ética, ainda assim, o estilo filosófico e a atitude filosófica permaneceriam os mesmos, pois as perguntas filosóficas - o que, por que e como - permanecem. Ainda nós perguntamos porquê devemos conhecer Filosofia para entender de Neurologia da Visão? In: Convite a Filosofia- Marilena Chauí Escrito por Leandro Rhein
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